segunda-feira, 16 de julho de 2012

Carros, carros, carros e mais carros...

Na semana passada eu fui buscar a minha mãe no aeroporto. Ela esteve fora durante mais de um mês e durante esse tempo eu estava com o carro dela. Fui deixá-la em casa no meio da tarde e depois, como tinha de voltar para o escritório, decidi deixar logo o carro com ela e voltar de ônibus. E foi mais um daqueles momentos que confirmam que o carro é mais um objeto que não deveria fazer falta nas nossas vidas. Eu vinha num ônibus que foi ficando progressivamente cheio, mas isso não me incomodou. Na realidade eu me sinto bem nos transportes públicos, é o que faz sentido para mim. Eu até gosto de dirigir, mas preferia dirigir apenas para viajar de férias ou ir fazer compras, coisas assim. E a rede de transporte público em Brasília é péssima. No “plano” – centro desta cidade estranha – há muitas linhas em funcionamento, mas a maioria é composta de carros velhos e descuidados. São raros os ônibus novos, confortáveis e em bom estado. Da mesma forma, a linha de metrô só serve um lado da cidade, e ainda assim de forma precária, pois demoram muito, estão sempre abarrotados durante o horário de ponta, encerram cedo durante o fim de semana, etc. E isso parece não ser uma exclusividade de Brasília. Já estive de férias em São Paulo e no Rio e tive a mesmíssima impressão dos ônibus de lá. A rede de metrô de São Paulo parece uma manta de retalhos com linhas desiguais e conexões e prolongamentos estranhos. O metrô do Rio me pareceu novo e confortabilíssimo.
 
Absorto nos meus pensamentos enquanto estava no ônibus, lembrei-me do quanto eu gostava de viver numa cidade onde eu não precisasse do carro para nada. É um sonho. E das poucas cidades que conheci acho que apenas Paris me ofereceu isso. A rede de metrô de lá é surreal. Há 20 anos atrás já existiam mais de 20 linhas que podiam levar qualquer pessoa de um ponto a outro da cidade em cerca de 30 minutos. Nem tudo era perfeito, claro. A proliferação de linhas transformou a cidade num queijo suíço, além de ser um desafio para qualquer pessoa tentar se orientar lá. Mas no computo geral, podia viver sem carro. Em Lisboa também foi um pouco assim, a uma escala bem menor. Além de andar muito mais a pé – coisa que gosto muito – eu usava muito mais o ônibus em Lisboa e vivi anos sem carro. Morávamos no centro da cidade e lembro-me da rotina de ir levar o filhote à escola e seguir para o trabalho, tudo a pé. Em Brasília, decidi morar no plano precisamente para não precisar de carro. Claro que já sonhei com um carro bonito, confortável, automático, com bom som – adoro música – ar condicionado, computador de bordo, sensor de estacionamento e todas as traquitanas que o dinheiro pode comprar. Mas felizmente esse desejo nunca foi forte o suficiente para eu procurar realizá-lo. Sempre passou com o tempo. Hoje tenho um carro emprestado – do meu irmão que se mudou – e ando nele por preguiça assumida. Ainda vou arranjar uma forma de o vender, mandar o dinheiro para ele e voltar a andar a pé e de bicicleta (já não ando de bicicleta há mais de 6 meses...).
 
E assim me pergunto hoje, porque raio é assim tão difícil desenvolver uma rede razoável de transportes públicos? A única forma de fazer as pessoas pararem de usar os carros, pararem de comprar carros. É assustadora a quantidade de carros que se vendem por dia. Na TV do elevador aqui do prédio onde trabalho tem aparecido uma publicidade recorrente de uma concessionária festejando o marco de mais de 5 mil carros vendidos no primeiro semestre deste ano, só em Brasília! E é só uma concessionária! Eu tremo cada vez que vejo esse numero que eles vendem como se fosse a melhor notícia do mundo desde a invenção do pente para carecas. Eu não acredito na famosa “carona solidária”. Não acredito mesmo. Pessoas aceitando partilhar algo seu com desconhecidos? No way, Jose! Talvez em outra evolução do ser humano. Nesta vida onde somos seres egoístas, com sentimento de posse – ensinada às crianças desde pequenas (as crianças não dão, elas emprestam...) – não creio que o famoso car-pooling seja solução. Os transportes públicos, por outro lado, não são de ninguém e são de todos ao mesmo tempo. Não tenho números concretos para suportar a minha teoria, mas tenho a sensação que a grande maioria das pessoas optariam por usar transportes públicos se estes fossem confortáveis, limpos e rápidos.
 
Então repito a pergunta: porque é assim tão difícil? Falta de dinheiro nos orçamentos públicos? Naahh, não pode ser. O orçamento de infraestrutura é bastante expressivo e faz parte dos 3 mais importantes gastos dos governos, em geral, junto com saúde e defesa, salvo erro (nota á parte: pena que educação não faz parte desse grupo). Então qual é a razão? Vontade política? Não pode ser. Acabou agora a Rio +20 que foi uma suprema decepção. Mas todos concordam – creio – que andamos a destruir o planeta. Não me venham com aquela conversa de que é “conversa de ecochatos”. São fatos. Os recurso do planeta não suportarão o nosso padrão por muito mais tempo. A única dúvida é precisamente essa: quanto tempo. 20 anos? 100 anos? Não faço ideia. Mas que pelo caminhar da carruagem vai tudo pró brejo, vai sim. Deal with it! Que outra razão pode existir? Falta de foco? Visão mercantilista a curto prazo? Talvez. É verdade que vejo todo o tipo de incentivos à baixa de impostos e taxas para compra de carros. Paralelamente a isso os combustíveis são supertaxados – bela fonte de receita – e o álcool (para aqueles que como eu colocam álcool no carro, independentemente de ser “pior para a carteira”) é caríssimo. Ou seja, o governo incentiva a venda de carros e ganha um dinheirão com o combustível necessário para estes andarem. Hmm, ok. Não sabia que os governos usavam o long tail! Nem sequer e inovador, pois os dealers de drogas já fazem isso há algum tempo. Entendo. Não aceito nem compartilho, mas entendo a lógica.
 
Então o que nos resta? No mundo atual, incentivar o modelo de transporte público em massa. Sim, façam aviões que possam levar ás quinhentas e mil pessoas ao mesmo tempo, barcos que levem aldeias inteiras mar afora. Pelo menos sinto que os danos serão “menos piores”. Paralelamente a isso, espero que encontrem uma forma de usar energias alternativas renováveis e não agressivas para o meio ambiente, para alimentar essas máquinas todas. Por mim, poderiam até colocar os passageiros todos a pedalar para ir de um lado para outro. Seria mais barato, ecológico e certamente um solução para o surto de obesidade mórbida das últimas décadas!!
 
Meu sonho? De verdade? Que alguém descubra finalmente o segredo da teleportação. Sério!